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Eletromobilidade global e o Brasil: caminhos para a integração na nova era dos transportes

Por Laís Víctor – Especialista em transição energética e diretora executiva de parcerias


Eletromobilidade global e o Brasil: caminhos para a integração na nova era dos transportes
Eletromobilidade global e o Brasil: caminhos para a integração na nova era dos transportes

A revolução silenciosa que redefine o transporte

A transição para a mobilidade elétrica vai muito além de uma mudança tecnológica, trata-se de uma transformação sistêmica que está redesenhando a economia global. A eletrificação dos transportes redefine a matriz energética, reorganiza a geopolítica das cadeias de suprimento e altera a própria lógica das cidades.


O avanço é tão acelerado que, segundo a Agência Internacional de Energia (IEA, Global EV Outlook 2025), a frota mundial de veículos elétricos deve ultrapassar 250 milhões de unidades até 2030, podendo representar cerca de 40% das novas vendas globais, caso se mantenha o ritmo atual de políticas e investimentos.


China, Estados Unidos e União Europeia lideram essa corrida com metas e políticas ambiciosas. A China responde por mais de 60% da produção mundial de veículos elétricos e domina as cadeias globais de baterias. A União Europeia aprovou a proibição da venda de novos veículos a combustão a partir de 2035, enquanto os Estados Unidos lançaram o Inflation Reduction Act, destinando aproximadamente US$ 370 bilhões em incentivos à indústria limpa com foco em veículos elétricos, fabricação de baterias e infraestrutura de recarga.


A eletromobilidade, portanto, não é mais uma tendência: é o novo padrão industrial e energético do mundo. E, embora o Brasil ainda avance em ritmo moderado, o país possui um potencial singular para se posicionar de forma estratégica e soberana nessa transformação global.


O Brasil no mapa da eletromobilidade

No contexto latino-americano, o Brasil ocupa uma posição paradoxal: é líder industrial, mas ainda aprendiz em mobilidade elétrica.Enquanto países como Chile, Colômbia e México já implementam políticas robustas de incentivo à eletrificação com metas nacionais de frota e infraestrutura, o Brasil ainda caminha em direção à consolidação de uma estratégia integrada.


Atualmente, o país conta com cerca de 270 mil veículos elétricos e híbridos em circulação (ABVE, 2025), número expressivo, mas que representa apenas 0,3% da frota total nacional. O crescimento é visível as vendas dobraram em relação a 2023, mas a adoção ainda é desigual, concentrada em frotas corporativas e de alto padrão.


O Programa Mover (2024), lançado pelo governo federal, é um passo importante. Ele cria incentivos fiscais para produção de veículos elétricos, híbridos e células a combustível, além de exigir contrapartidas em pesquisa, desenvolvimento e descarbonização industrial. No entanto, para transformar o país em ator global, será preciso ir além da montagem de veículos será preciso entrar nas cadeias internacionais de valor.


Panorama latino-americano: onde estamos e para onde ir

A América Latina vive uma aceleração regional da mobilidade elétrica, impulsionada por políticas públicas e compromissos climáticos.

  • O Chile planeja eliminar a venda de veículos leves a combustão até 2035 e lidera na eletrificação do transporte público.

  • A Colômbia criou o Fundo de Mobilidade Sustentável, que subsidia veículos elétricos e pontos de recarga.

  • O México atraiu fábricas de montadoras globais e investe pesado na produção de baterias e lítio.


O Brasil, com uma das maiores matrizes elétricas limpas do mundo (cerca de 87% renovável), possui uma vantagem comparativa única: pode produzir veículos elétricos com pegada de carbono até 70% menor que a de países que ainda dependem de carvão ou gás.Essa característica torna o país naturalmente competitivo para receber investimentos industriais em um mercado que valoriza a rastreabilidade e a sustentabilidade.

Mas, para competir de igual para igual, será preciso mais que recursos naturais: será preciso coordenação política, visão de longo prazo e segurança regulatória.


Indústria nacional e acordos internacionais: o elo estratégico

Nos últimos anos, o país começou a se mover. Montadoras globais anunciaram investimentos superiores a R$ 130 bilhões até 2028 para eletrificar linhas de produção no Brasil.Entre os destaques:

  • A BYD iniciou a instalação de sua fábrica em Camaçari (BA), transformando o antigo polo da Ford em centro de eletromobilidade;

  • A Volkswagen planeja lançar modelos híbridos flex e elétricos de produção nacional;

  • E a Stellantis, dona de marcas como Fiat e Jeep, anunciou R$ 30 bilhões em investimentos com foco em eletrificação e biocombustíveis.


Esses movimentos mostram que a indústria automotiva brasileira está se reposicionando diante do novo paradigma global.A parceria com países europeus e asiáticos também avança: o Brasil integra discussões com Alemanha, Coreia do Sul e Japão sobre cooperação tecnológica em baterias, hidrogênio e semicondutores.


No entanto, o país ainda carece de uma estratégia industrial verde consolidada, que alinhe incentivos fiscais, infraestrutura de recarga e integração energética.Sem isso, corremos o risco de sermos apenas consumidores de tecnologia, e não desenvolvedores de inovação.


Exportação e integração de cadeias globais

O papel do Brasil na transição para a eletromobilidade pode e deve ir muito além da produção de veículos. O país reúne um conjunto singular de vantagens comparativas que o posicionam estrategicamente nas cadeias globais de valor. Entre elas, destacam-se a disponibilidade de insumos críticos para a fabricação de baterias, como lítio, níquel, manganês e grafite e um ecossistema energético majoritariamente renovável, fatores que conferem ao Brasil uma vantagem competitiva rara em escala mundial.


Regiões como o Vale do Jequitinhonha (MG) já se consolidam como polos emergentes de mineração sustentável de lítio, com operações voltadas à exportação e práticas de menor impacto ambiental. Paralelamente, empresas brasileiras começam a integrar consórcios internacionais de pesquisa, como o Battery 2030+, iniciativa europeia voltada à inovação em materiais e à consolidação de uma economia circular para baterias.


Se bem estruturado, esse movimento pode permitir ao Brasil transcender o papel de mero exportador de commodities, assumindo uma posição de fornecedor estratégico de insumos críticos, tecnologia e conhecimento integrando-se de forma qualificada às cadeias globais de valor.


No entanto, esse potencial só se materializará por meio de um esforço coordenado entre governo, setor privado e academia, capaz de alinhar pesquisa científica, regulação ambiental e política industrial. A construção dessa ponte entre recursos naturais e inovação tecnológica é o que definirá o verdadeiro protagonismo do Brasil na nova economia da mobilidade elétrica.


Baterias, energia limpa e infraestrutura: o triângulo de valor

A transição para a eletromobilidade só será verdadeiramente sustentável se estiver apoiada em três pilares fundamentais: baterias, energia limpa e infraestrutura de recarga. Esses elementos formam o que podemos chamar de um triângulo de valor, um ecossistema interdependente que determina o grau de competitividade e maturidade da mobilidade elétrica em qualquer país.


O Brasil parte de uma vantagem estrutural incontestável: uma matriz elétrica majoritariamente renovável, composta por fontes hidráulicas, eólicas, solares e de biomassa. Essa base limpa posiciona o país à frente das principais economias globais, muitas das quais ainda enfrentam o desafio de descarbonizar seus sistemas energéticos. Integrar a produção e o uso de veículos elétricos a esse contexto representa uma oportunidade única de consolidar um ciclo de mobilidade 100% sustentável da geração ao consumo.


Segundo dados da CNN Brasil (2025), o país conta atualmente com aproximadamente 15 mil eletropostos públicos e semi-públicos, concentrados principalmente nas regiões Sudeste e Sul. Embora o avanço seja expressivo, o número ainda é modesto diante da dimensão territorial brasileira e do crescimento acelerado da frota elétrica projetado para os próximos anos.


A expansão dessa rede exigirá uma articulação estratégica entre o poder público e a iniciativa privada, com foco em padronização técnica, incentivos fiscais e planejamento regional integrado, capaz de equilibrar fluxos de transporte, densidade populacional e consumo energético.


Nesse contexto, iniciativas como a Rede Nacional de Eletropostos, conduzida pela EPE em parceria com o Ministério de Minas e Energia (MME), e os acordos entre empresas de energia, concessionárias e montadoras, começam a desenhar um mapa nacional de recarga, conectando corredores logísticos, polos industriais e centros urbanos.


No entanto, o sucesso dessa jornada dependerá menos da quantidade de pontos de recarga e mais da qualidade da integração entre energia, transporte e indústria. Esse alinhamento sistêmico é o que permitirá ao Brasil não apenas acompanhar a tendência global, mas liderar um modelo próprio de eletromobilidade, competitivo, sustentável e socialmente inclusivo.


Eletromobilidade e reindustrialização verde

A transição energética global está redefinindo o conceito de competitividade industrial no século XXI. O novo paradigma não se baseia apenas em custos de produção, mas na capacidade de conciliar crescimento econômico, inovação tecnológica e sustentabilidade ambiental. Nesse cenário, a mobilidade elétrica emerge como um dos vetores mais transformadores da economia contemporânea e como uma oportunidade única para o Brasil redesenhar seu modelo de desenvolvimento industrial.


Enquanto economias avançadas investem bilhões em subsídios diretos e políticas protecionistas para impulsionar suas cadeias de eletromobilidade, o Brasil possui um diferencial ainda mais poderoso: a possibilidade de integrar energia limpa, biocombustíveis e inovação tecnológica em uma estratégia industrial própria. Essa combinação é rara e valiosa. A base renovável da matriz elétrica nacional, somada à experiência acumulada com o etanol e o biodiesel, oferece ao país condições ímpares para construir uma reindustrialização verde, capaz de gerar empregos qualificados, reduzir emissões e fortalecer a soberania tecnológica.


Mas essa reindustrialização não acontecerá de forma espontânea. Exige visão de Estado e coordenação institucional. É essencial investir na criação de centros de pesquisa aplicada em mobilidade elétrica, fomentar startups e hubs de inovação voltados ao desenvolvimento de baterias, softwares de gestão de frotas e integração veicular, além de estabelecer parcerias internacionais estratégicas para transferência de conhecimento e atração de capital produtivo.


Mais do que fabricar carros elétricos, o Brasil precisa construir um ecossistema industrial completo, capaz de exportar tecnologia, componentes e inteligência. Isso significa transformar nosso potencial energético e científico em vantagem competitiva global, consolidando o país como um polo de inovação em mobilidade limpa e sustentável.


O Brasil no volante da transição

O mundo já entrou, de forma irreversível, na era da eletromobilidade. O que está em disputa agora não é apenas quem dirige os veículos elétricos, mas quem controla as cadeias de valor, a tecnologia e a riqueza que esse novo ciclo econômico irá gerar.

O Brasil tem todas as condições de ocupar um lugar de protagonismo nessa nova geopolítica dos transportes.


Dispomos de uma matriz elétrica predominantemente renovável, de recursos minerais estratégicos, de uma indústria instalada e de uma expertise única em biocombustíveis. Mas essas vantagens só se tornarão efetivas se forem transformadas em estratégia nacional, conectando política industrial, inovação e integração internacional.


A mobilidade elétrica não é apenas um mercado é uma visão de país, um projeto de futuro que une tecnologia, sustentabilidade e desenvolvimento social.E o futuro não espera: ele pertence a quem tem coragem de conduzir a transição com propósito, cooperação e visão de longo prazo.


O Brasil ainda não está no pelotão de frente, mas tem todos os elementos para acelerar. Cabe a nós decidirmos se seremos passageiros da transição ou motoristas do nosso próprio destino energético.


Sobre a autora 

Laís Víctor é especialista em energias renováveis e diretora executiva de parcerias, com 14 anos de atuação no setor de energia. Sua atuação inclui o desenvolvimento de negócios, estruturação de alianças estratégicas e apoio à atração de investimentos para projetos de transição energética, com foco na construção de ecossistemas sustentáveis e inovação no mercado global de renováveis. 


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