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Antifragilidade e cisnes negros no setor elétrico brasileiro

Nassim Taleb construiu uma obra que virou referência para entender estruturas expostas à incerteza, múltiplas variáveis e choques inesperados. Sua grande contribuição foi mostrar que certos arranjos não apenas resistem ao caos, mas se aperfeiçoam quando submetidos a ele; é o que ele chama de antifragilidade. Esse conceito ajuda a perceber que modelos que aparentam estabilidade podem esconder vulnerabilidades, enquanto outros, mais flexíveis, ganham força precisamente porque não dependem de um controle central rígido.


Antifragilidade e cisnes negros no setor elétrico brasileiro
Antifragilidade e cisnes negros no setor elétrico brasileiro

Ao aproximar essa lógica da realidade do setor elétrico brasileiro, surge uma provocação interessante. Como um pensador que valoriza mecanismos descentralizados e adaptativos interpretaria um mercado que, historicamente, se organiza por decisões centralizadas, cronogramas elaborados em gabinetes e respostas padronizadas? Talvez essa leitura revele tensões relevantes entre a busca por previsibilidade e a necessidade de permitir que o sistema aprenda com seus próprios choques.


Se, por um lado, é necessário reconhecer o mérito das estratégias de longo prazo conduzidas pelos planejamentos decenais da EPE na transmissão e a lógica do monopólio natural que justifica a operação das redes de distribuição, por outro, há dimensões do setor que não se beneficiam com igual eficiência desse tipo de organização. Algumas áreas respondem melhor quando contam com maior autonomia decisória, competição e caminhos múltiplos para a solução de problemas, especialmente em segmentos em que a diversidade de agentes e de tecnologias tende a produzir resultados mais ajustados às mudanças do mercado.


O ponto seguinte envolve compreender o papel do Custo Marginal de Operação (CMO), que representa o valor calculado para indicar quanto custa atender um incremento de carga em uma dada condição hidrológica e operativa. Esse parâmetro influencia diretamente o Preço de Liquidação das Diferenças (PLD), mecanismo que busca emular, por meio de modelos matemáticos sofisticados, um sinal econômico para orientar a operação do sistema e as transações no mercado de energia.


Ocorre que, embora o PLD seja tecnicamente consistente, ele não nasce das trocas voluntárias entre agentes nem reflete de forma integral a dinâmica de escassez e abundância típica de mercados concorrenciais. Nas partes do setor elétrico em que há liberdade para negociar, como geração e comercialização, ainda falta um preço que incorpore expectativas, preferências individuais, percepções de risco e custos marginais reais. Sem essa referência, permanecemos submetidos a um sinal administrado, que limita a alocação eficiente de recursos, reduz a sensibilidade das tarifas às condições reais e enfraquece incentivos para inovação, investimento e gestão de risco. 


Uma forma interessante de retomar Taleb nesse ponto é observar como sua crítica às estruturas excessivamente amplas e hierarquizadas dialoga com o setor elétrico.


Ele argumenta que arranjos muito abrangentes, como grandes federações, tendem a funcionar pior do que unidades menores e mais próximas do problema, como condados, justamente porque decisões tomadas longe da realidade local perdem precisão e sensibilidade. Esse raciocínio ajuda a iluminar a tensão recorrente entre o nível de coordenação necessário para manter a confiabilidade do sistema brasileiro e a necessidade crescente de desconcentração, pluralidade de agentes e respostas adaptadas às condições específicas de cada região.


É nesse cruzamento que conceitos como antifragilidade podem revelar possíveis caminhos de evolução institucional.


À medida que essa lente de descentralização e aprendizado ganha nitidez, vale recuperar outro ponto central da obra de Taleb: os cisnes negros.


Eventos raros, imprevistos e de grande impacto não são anomalias estatísticas, mas inevitabilidades em sistemas complexos. O setor elétrico brasileiro oferece exemplos claros desse padrão. A MP 579 desorganizou o fluxo econômico das concessões e exigiu a criação da Conta-ACR para sustentação emergencial do caixa das distribuidoras.


A pandemia levou à montagem da Conta-Covid. No caso do GSF, havia o Mecanismo de Realocação de Energia justamente para lidar com oscilações hidrológicas, mas o arranjo se apoiava em pressupostos matemáticos e modelagens estocásticas que não captaram a severidade e a duração dos déficits. Por fim, o curtailment recente evidencia limites físicos e operacionais que não estavam plenamente internalizados pelo modelo. Cada um desses episódios expõe como o sistema reage de forma limitada a choques fora do escopo previsto, exigindo soluções extraordinárias e, muitas vezes, caras.


A convivência histórica entre centralização e descentralização no setor elétrico revela algo fundamental: sistemas complexos se tornam mais robustos quando incorporam a informação distribuída entre seus próprios participantes. A experiência mostra que tecnologia, competição e interação voluntária entre agentes tendem a criar mecanismos de proteção mais eficazes do que modelos matemáticos que partem de hipóteses rígidas. Por mais valiosa que seja a modelagem, ela não captura integralmente o conhecimento disperso pelos agentes nem a velocidade com que preferências, custos e contingências evoluem.


A combinação de inovação tecnológica, liberdade de escolha e sinais econômicos mais claros cria um ambiente em que o setor aprende com seus próprios choques em vez de depender exclusivamente de uma estrutura de planejamento que tenta antecipar o imprevisível. Essa reorganização não elimina a necessidade de coordenação setorial, mas reduz sua fragilidade estrutural ao permitir que decisões e ajustes ocorram mais próximos da realidade concreta.


Em linhas gerais, a experiência internacional indica que mercados bem desenhados e arranjos institucionais menos engessados oferecem um caminho mais sólido para enfrentar incertezas do que qualquer esforço central de previsão apoiado unicamente em modelagem. 



Antifragilidade e cisnes negros no setor elétrico brasileiro

Por Daniel Steffens, sócio da Área de Energia e Infraestrutura do Urbano Vitalino Advogados.




Antifragilidade e cisnes negros no setor elétrico brasileiro



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