Como a ausência de saneamento básico agrava os impactos das mudanças climáticas no Brasil
- Francisco Carlos Oliver
- há 28 minutos
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A Cop 30 terminou e vai gerar muitos debates ainda sobre as mudanças climáticas e o saneamento básico no Brasil

Por Engº Francisco Carlos Oliver
A falta ou insuficiência de saneamento básico (que engloba o fornecimento de água, tratamento de esgoto, limpeza urbana e gestão de resíduos sólidos, além da drenagem e gestão de águas pluviais), e como o saneamento básico é um dos pilares mais eficientes de mitigação de riscos climáticos, sua falta torna consideravelmente o Brasil mais suscetível aos efeitos das alterações climáticas, intensificando suas consequências adversas. Cidades com redes deficientes sofrem muito frente a eventos extremos (chuvas intensas, ondas de calor e estiagens prolongadas).
A implementação de soluções, por sua vez, exige um sólido planejamento a longo prazo, investimentos e a convergência das políticas de saneamento com as políticas de planejamento urbano e gerenciamento de riscos e catástrofes. Como temos 26 Estados e um distrito, e um total oficialmente de 5.570 municípios, o consenso e alinhamento ficam mais complicados. Há muitos interesses e necessidades diferentes, que devem ser considerados e analisados profundamente.
Mas o que fica evidente é que a carência de saneamento básico no Brasil aumenta os impactos das mudanças climáticas porque deixa as cidades mais vulneráveis a enchentes e deslizamentos, e aumenta a incidência de doenças que se agravam com o calor e chuvas intensas. Em períodos de seca diminui a disponibilidade de água potável e multiplica danos materiais, elevando os custos econômicos. No entanto, o que mais entristece é que lamentavelmente penaliza desproporcionalmente as populações mais pobres.
O que tem ficado evidente e não se pode ignorar é que o saneamento básico insuficiente aumenta os danos causados por eventos climáticos extremos. Naqueles períodos de chuvas intensas e inundações a inexistência de coleta e tratamento de esgoto contribui expressivamente para a propagação das inundações, que misturam águas pluviais, esgoto bruto e lixo. O resultado é a contaminação de rios e mananciais utilizados como fontes de água potável.
O contato com água contaminada eleva consideravelmente o risco de surtos de doenças transmitidas pela água, como leptospirose, cólera, hepatite A e diarreias graves. Essas mazelas sobrecarregam o sistema de saúde público.
Entre outras funções o saneamento básico é a principal barreira contra muitas doenças. Se ele não for utilizado adequadamente, potencializa bastante o risco de saúde associado às mudanças climáticas. Com o aumento das temperaturas globais, a população fica mais vulnerável a muitas moléstias, principalmente por causa do crescimento de vetores como o mosquito Aedes aegypti, que transmite a dengue, zika e Chikungunya.
Por sua vez, os sistemas de drenagem ineficientes não conseguem dar vazão ao volume de água das chuvas mais fortes (mais frequentes e intensas), o que resulta em alagamentos que comprometem a infraestrutura de abastecimento e tratamento de água e esgoto. O problema pode até levar à interrupção dos serviços em certas ocorrências.
Nos períodos de secas prolongadas e ondas de calor causadas pelas mudanças climáticas existem outros desequilíbrios ambientais. A competição e escassez por água pode se tornar preocupante, porque a estiagem diminui consideravelmente o volume nos mananciais. E a falta de tratamento de esgoto, agrava a escassez porque reduz a quantidade de água que poderia ser tratada e reutilizada, para usos não potáveis ou para reintrodução em corpos hídricos como rios, lagos, aquíferos ou lagoas, que podem ser naturais ou artificiais, porém são essenciais para a vida e para o uso humano.
A qualidade da água é sem qualquer hesitação uma das mais prejudicadas. A redução do volume de água nos rios eleva a concentração de poluentes gerados nos esgotos não tratados. Por causa das altas temperaturas, a proliferação de algas tóxicas e outros microrganismos se torna um ambiente favorável para seu aumento, tornado a água remanescente mais difícil e cara de ser tratada, e muitas vezes inviável para o consumo humano.
Uma das principais medidas de adaptação às mudanças climáticas é a construção de infraestrutura de saneamento básica avançada e compatível com as reais necessidades de uma comunidade ou de uma população maior. Sua falta impede que elas se preparem adequadamente para o futuro provocado pelas mudanças climáticas.
Lamentavelmente a ausência de saneamento básico torna a população bem mais vulnerável às adversidades climáticas, transformando situações que poderiam ser controladas em crises de saúde e meio ambiente, e em alguns casos até de grandes proporções.
A vulnerabilidade social causada pela desigualdade está muito ligada ao saneamento precário. Aquelas populações sem acesso ao saneamento básico, geralmente residem em áreas de ocupação informal e de risco (como encostas e margens de rios). Por essa razão, as pessoas ficam mais vulneráveis aos desastres climáticos e suas consequências interferem na saúde de todos os moradores da localidade. A fragilidade da infraestrutura também afeta de maneira desproporcional as pessoas. É crucial, portanto, investimentos em soluções de saneamento resiliente e adaptativo para reduzir a vulnerabilidade social no Brasil.
O transtorno se estende para outros aspectos, porque muitas infraestruturas urbanas já instaladas também apresentam problemas, porque diversos sistemas de saneamento existentes também podem estar fragilizados. Em certos locais em que o saneamento já está presente, a infraestrutura do lugar pode não estar preparada para enfrentar adequadamente os novos eventos climáticos extremos, como tornados, grandes tempestades ou até ondas de calor. Se tornou urgente por isso, segundo alguns estudiosos, que se realize um planejamento de saneamento e climático bem mais profundo para antever nos próximos anos cenários climáticos extremos, a fim de se evitar colapsos no abastecimento de água e tratamento de esgoto.
O website Think Global Health, do Conselho de Relações Exteriores e Instituto de Métricas e Avaliação da Saúde (IHME), afirmou em sua matéria ‘COP30 e as consequências climáticas de ignorar o saneamento básico’ que o clima e o saneamento se cruzam e as mudança climáticas e as condições sanitárias têm uma relação bidirecional. O veículo considerou que a Cop 30 se tornou um momento crítico no qual todos os países deviam participar das soluções para as mudanças climáticas e o saneamento.
Na visão daquela publicação, as políticas de saneamento devem priorizar sobretudo os grupos mais vulneráveis — mulheres, meninas, pessoas com deficiência e populações deslocadas — com financiamento específico e indicadores para monitorar o progresso. Além disso, são necessários urgentemente sistemas de dados confiáveis e sensíveis ao clima para orientar os investimentos, evitar duplicação de esforços e garantir o máximo impacto. O site defende ainda que o governo deve apoiar as comunidades na criação conjunta de soluções. Há exemplos de países da Ásia meridional, em que a liderança local multiplica o impacto desse trabalho.
Segundo Think Global Health, o Plano de Ação de Saúde na COP 30 oferece um roteiro para conciliar clima e saneamento, mas só terá sucesso se o saneamento for claramente definido em suas metas, além do financiamento e sistemas de monitoramento.
Hoje em dia, pela nossa perspectiva, é essencial para o poder público brasileiro ampliar o acesso ao saneamento básico com infraestrutura adaptada às mudanças climáticas, ou seja, seria o foco no investimento no chamado ‘saneamento resiliente’, aquele em que o ecossistema tem plena capacidade de retornar à condição original de equilíbrio após suportar alterações ou perturbações ambientais. Deste modo, as condições sanitárias essenciais precisariam estar integradas às estratégias de adaptação climática, com especial atenção na saúde pública e na justiça social.
Engº Francisco Carlos Oliver é diretor técnico industrial da Fluid Feeder Indústria e Comércio Ltda., especializada em tratamento de água e de efluentes por meio de soluções personalizadas. www.fluidfeeder.com.br
Como a ausência de saneamento básico agrava os impactos das mudanças climáticas no Brasil








