O retrocesso da energia: lei que perpetua energias sujas é sancionada
- EnergyChannel Brasil

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O repúdio à Lei nº 15.269 sancionada ontem é inevitável. Nosso potencial está sendo barrado pela incapacidade de avançar em um verdadeiro “mapa do caminho” para a transição energética.

Por Renato Zimmermann é desenvolvedor de negócios sustentáveis e ativista da transição energética
O eixo temático da COP, a transição energética era um dos mais esperado, mas se perdeu em meio aos lobbies das indústrias de petróleo e combustíveis fósseis, revelando que, apesar do discurso, o país segue prisioneiro de interesses poderosos.
Entre esses interesses, a indústria do gás natural ocupa lugar de destaque. Nos últimos anos, grandes grupos empresariais vêm adquirindo usinas termelétricas em série, consolidando um poder que se estende sobre a política energética nacional.
Embora nomes não sejam citados aqui, basta pesquisar quem é chamado de “rei do gás” para encontrar um dos protagonistas dessa concentração. O resultado é um setor elétrico cada vez mais dependente de contratos bilionários que favorecem poucos e perpetuam a lógica das energias fósseis.
Não por acaso, o ex-presidente da Petrobras, Jean Paul Prates, denunciou que medidas provisórias vinham sendo manipuladas para favorecer negócios bilionários ligados ao setor energético. Sua saída da estatal foi marcada por atritos com o governo e acusações de “intrigas palacianas”.
Em entrevistas, Prates apontou que havia pressão para moldar políticas públicas em benefício de grupos específicos, especialmente no mercado de gás e termelétricas. Embora parte das denúncias tenha sido arquivada pela Comissão de Ética Pública, o episódio expôs a fragilidade institucional diante de interesses privados e reforçou a percepção de captura regulatória.
O golpe final veio em 24 de novembro de 2025, quando o presidente Luiz Inácio Lula da Silva sancionou, sem vetos neste ponto, a Lei nº 15.269, oriunda da MP 1.304.
O dispositivo pró-carvão perpetua a contratação obrigatória de energia de termelétricas a carvão mineral até 2040, além de prorrogar por 25 anos as concessões dessas usinas.
Trata-se de uma decisão que garante vida longa a uma das fontes mais poluentes da matriz elétrica brasileira, em contradição direta com os compromissos climáticos assumidos pelo país. Estima-se que os contratos movimentem bilhões de reais em subsídios e tarifas, recursos que poderiam ser destinados a armazenamento de energias limpas, como baterias de larga escala, na geração distribuída e sistemas de hidrogênio verde.
O contraste é gritante: enquanto a Agência Nacional do Petróleo projeta R$ 609 bilhões em investimentos em petróleo e gás entre 2025 e 2029, sendo R$ 140 bilhões apenas em 2025, o setor solar prevê R$ 39 bilhões em aportes no mesmo ano, elevando a capacidade instalada para 64,7 GW. Há ainda planos de R$ 3,2 trilhões em renováveis até 2034, mas o curto prazo segue dominado por fósseis.
A COP30, abastecida por geradores a diesel, foi o retrato simbólico desse atraso. A ironia é que a Amazônia, palco da conferência, continua abastecida por gás e diesel, quando poderia ser referência mundial em projetos inovadores de energia solar, eólica e armazenamento. O entrave não é técnico, mas político: os interesses de grupos poderosos que articulam junto ao governo para manter privilégios e contratos.
Os valores bilionários destinados à manutenção de carvão e gás poderiam inaugurar uma nova era energética, mais descentralizada, democratizada, digitalizada e limpa. Mas a MP 1.304 não modernizou absolutamente nada: apenas redesenhou contratos e fortaleceu energias sujas. O Brasil tem potencial para liderar uma revolução energética, mas escolheu ser refém do gás e do carvão. O resultado é um setor elétrico que não se moderniza, não se democratiza e não se descarboniza e uma sociedade que paga a conta desse atraso.
A COP30 mostrou que o Brasil tem vozes fortes e diversificadas clamando por mudança. Mas também revelou que, quando se trata de energia, o país segue prisioneiro de lobbies poderosos. O repúdio à Lei nº 15.269 é inevitável: ela cristaliza um retrocesso histórico e compromete o futuro da transição energética.
O Brasil poderia ser protagonista de uma matriz limpa e inovadora, mas preferiu perpetuar modelos comerciais que beneficiam poucos e atrasam muitos. O fechamento é amargo: a COP30 ficará marcada não pelo avanço da transição energética, mas pelo retrato de um país que pensa errado, investe mal e insiste em manter viva a energia suja em sua matriz.
O retrocesso da energia: lei que perpetua energias sujas é sancionada











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